Este ano,
diversos eventos no Brasil comemoram o centenário de nascimento do escritor
Nelson Rodrigues. Nascido em 23 de agosto de 1912, em Recife, onde viveu apenas
até os 4 anos de idade, sua família migrou para o Rio de Janeiro.
Nelson trabalhou em vários jornais. Além de se tornar um importante cronista,
destacando-se também como cronista esportivo, ele escreveu folhetins, contos,
romance e teatro. Foi neste gênero que construiu uma
obra que ele mesmo classificou como um “teatro desagradável”, por representar personagens
em situações limite, mas que o consagraram como o maior dramaturgo brasileiro.
Morreu aos 68 anos, em 21
de dezembro de 1980, de trombose e insuficiência cardíaca, sem presenciar seu
prestígio. Aliás, ouviu a vaia do público algumas vezes, e na ocasião de
encenação de sua peça Senhora dos Afogados, em 1954, disse: Queria
desagradar muito mais. A vaia parcial a Senhora dos Afogados parece-me
insuficiente. Só me sentirei bem quando merecer uma vaia total.
O teatro rodrigueano apresenta
um universo em que a pureza não tem lugar. Nele, as personagens expõem seus
demônios internos e imprimem uma visão pessimista do autor sobre as
possibilidades de realização afetiva do ser humano. Assim, só podemos encontrar
desfechos infelizes nas histórias dos tantos casais e amantes de suas 17 peças.
Vale destacar que entre elas apenas uma tem final feliz, peça que chamou de Anti-Nelson
Rodrigues. A ironia do título é autoexplicativa: só mesmo na obra em que o
autor se propõe à contradição, poderíamos encontrar uma cena final em que as
personagens se beijam! No
entanto, a falsidade desse desenlace é evidenciada pela nota do
autor para que os atores beijem-se como nos filmes antigos, porque se fosse
uma cena real...Ao saborearmos suas peças, as ironias e sarcasmos não devem
passar desapercebidos.
Nelson apropriou-se de
técnicas do melodrama, compondo uma ação veloz, pontuada por revelações
surpreendentes e reviravoltas súbitas. Suas histórias lidam sempre com
situações extremas e ações extraordinárias. As personagens são,
necessariamente, criaturas movidas por forças obscuras e densas. Isso tudo se
traduz – no palco ou nas páginas de contos, romances, e crônicas – em uma expressão
sobrecarregada. As rubricas e descrições do autor referem-se detalhadamente às
atitudes, aos gestos, aos comportamentos corporais e às ressonâncias vocais.
Consequentemente, são representados seres destemperados, comumente em
discussão, estendendo as mãos em súplica, prostrando-se aos pés uns dos outros,
atirando-se ao chão, emitindo gritos, clamando soluções. Esses extremos fizeram com que o amigo Manuel
Bandeira o questionasse:
“Nelson, por que você
não escreve sobre pessoas normais?”, perguntou Bandeira. E Nelson, levantando
as mãos ao céu: “Mas, meu querido Bandeira, eu escrevo sobre pessoas como você
e eu!” (Ruy Castro. “Prefácio a Nelson Rodrigues” in O melhor do romance,
contos e crônicas. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.)
Só nos resta ler e questionar: O que
há de nossas vidas em suas obras?
Confira este artigo publicado na coluna Nosso Idioma, do Gazeta Brazilian News...